01 janeiro 2014

WHAT A DIFFERENCE A DAY MAKES

A minha sogra faz anos a 23 de Dezembro, o que faz com que seja prejudicada nos presentes que lhe são devidos por anos e Natal, e o seu aniversário se confunda com rabanadas e bolo-rei pois celebrar em separado duas festividades tão coincidentes não é tarefa fácil, sobretudo quando alguns membros da família chegada moram a mais de dois mil km.
Mas este 2013 ela festejava oitenta anos; por isso programou-se um jantar especial para comemorar o facto, e a Nita, o Patrick e a Dominique vieram mais cedo de Bruxelas, e o Zé João da Alemanha.
Depois do jantar, de mesa e enfeites em todo semelhantes a uma Consoada, as prendas foram entregues ainda estávamos todos sentados à mesa e esse pormenor marcou a diferença em relação à noite de Natal, em que os presentes são distribuídos a partir dos sofás da sala. A Nita apareceu com um embrulho muito apreciado: um calendário para 2014, sumptuosamente produzido, cujas folhas eram ilustradas com fotos da família e onde alguns dias de alguns meses do ano eram assinalados por miniaturas fotográficas dos membros da família que tinham nascido nesse dia.
A minha sogra estava sentada à cabeceira da mesa e, para observar de perto o presente, as pessoas foram-se levantando dos respectivos lugares e formando um cacho por trás dela.
Estava já o calendário desfolhado, e prestes a ser remetido ao seu envelope imaculadamente cintilante, quando a minha cunhada Margarida pronunciou:
“Ora mostra outra vez aquela fotografia em que estamos todas na varanda...”
A fotografia foi repescada e, pelo tamanho da minha sobrinha Carolina, ao colo da Nita, e da barriga da Margarida, grávida na época do João Pedro, determinou-se o ano de meados da década de 80 em que o instantâneo teria sido tirado.  
“Olha-me só aqueles penteados!...”, comentou uma das vítimas.
Mas a Margarida, provavelmente seria essa a raiz do pensamento que a fez pedir para ver a foto uma segunda vez, continuava a invocar detalhes originados na imagem, acabando por observar às cunhadas:
“Já repararam que a tua mãe tinha nessa altura a idade que nós temos agora...?”
Todos nos ficámos a perscrutar o retrato com um novo olhar, em que a relatividade dos dias ganhara um relevo até ali insuspeito.
“E eu tenho hoje a idade que a minha mãe teria aqui...”, comentou a minha sogra, mirando a D. Lívia que, encravada entre as netas, nos olhava encadeada pela luz da tarde. 

Nota: "What a Difference a Day Makes" é o título de uma canção de Adams/Grever. Fica aqui na sua versão da Dinah Washington.

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