Tem alguém de quem se quer vingar,
alguém que o ameaça ou, simplesmente, alguém que o irrita? Então, porque não
considera a hipótese de se ver livre dele(a) de uma forma definitiva?
Uma conhecida personagem pública
portuguesa, homem muito dado à religião e figura maior na política portuguesa
dos anos 80, demonstrou, brilhante e recentemente,
como proceder com sucesso em situações deste género. Antes de aconselhar a
receita, exponho aqui, em frugal dúzia de linhas, o contexto do que se passou
com ele e com o seu problema particular.
Domingos Duarte Lima é advogado e, por
via das suas relações profissionais conseguiu que uma velha dama portuguesa
residente no Brasil, viúva informal de um senhor riquíssimo, depositasse numa
conta Suíça de que o homem é titular, a irrisória quantia de cinco milhões de
euros. Mas as relações entre ambos complicaram-se, a senhora exigiu a devolução
do dinheiro e, esse foi o seu mal, ameaçou o causídico de que tornaria os
factos, bem como os meandros do negócio, públicos.
A polícia brasileira que, tudo leva a
crer, levou a cabo uma investigação consistente e pormenorizada, concluiu que o
Dr. Lima viajou até ao Brasil, a convenceu a dar uma volta pelas redondezas e
lhe enfiou três tiros nocturnos, deixando-a a boiar numa poça de água e lama. Após
a proeza, o nosso herói, homem que conhece as leis portuguesas como as suas
mãos, regressou de imediato à pátria.
Agora que a investigação está
concluída e documentada, o Dr. Lima é o único suspeito do homicídio e o Brasil
gostaria que o senhor fosse extraditado para o julgar convenientemente e o
presentar com uma pena de prisão que rondará os 30 anos. Acontece que Portugal
não tem acordo de extradição com o Brasil, pelo que o presumível homicida ficará
deste lado do mar, para ser julgado pensaríamos nós. Mas não, a lei portuguesa
não se obriga a tal e, tendo em conta a dificuldade em reconstituir por cá o
que por lá se passou, o mais certo é o processo não dar em nada, isto é, o
homem não será condenado ou a probabilidade de o ser é ínfima. No entanto, precavida,
a nossa preciosa Justiça pensou em tudo e prevê, no quadro penal, uma hipótese em
que o presumível assassino pode ser engavetado numa prisão portuguesa, com
certeza com vistas e amenidades mais confortáveis do que as congéneres
brasileiras. Segundo essa alternativa, a justiça portuguesa poderá analisar o
caso, talvez condenar o homicida a pena de prisão efectiva e se este der o seu acordo será então aferrolhado
numa cela.
Saiba, então, cara(o) ouvinte, como proceder
em caso de ter alguém que o incomoda: escolha um país sem acordo de extradição
com Portugal (o Brasil é destino muito prático, tendo em consideração a língua
e o clima), convença a sua vítima a ir até lá, enfie-lhe um tiro entre os olhos
(um lugar bastante seguro em termos de resultados) e regresse a Portugal no
primeiro voo.
Depois, é só aguardar com toda a calma,
evitar viajar para países onde os mandatos internacionais de extradição com o
Brasil estejam em vigor, e, claro, negar sempre tudo. No final, o pior que lhe
pode acontecer é perguntarem-lhe se consente em ir preso. Se sentir alguma
tentação em responder “sim” consulte antes o seu psiquiatra.
Nota: “Ri melhor quem ri impune” é frase de fecho da canção “Profissionalismo é isso aí” de João Bosco e Aldir
Blanc.
© Fotografia de Pedro Serrano, 2011.