31 março 2012
29 março 2012
AS ONDAS, AS ONDAS
Por algum motivo eu ia à frente, fui o
primeiro a chegar ao cimo das escadas, ou do caminho íngreme, e à orla daquela
imensidão. Dali para a frente e, parecia que para todo o sempre, a água
estendia-se aos meus pés, mansa como a de um lago, transbordada de um azul que
cintilava à luz como escamas de peixe faiscando na lota.
“Vejam...”, disse para trás, com um
sorriso, ao meu pai e, depois dele, ao meu filho que chegavam por sua vez à
fímbria do mar. Em seguida, não sabendo muito bem como reagir àquela infinitude,
ajoelhei-me no último degrau da escada, inclinei-me e pousei a
testa no primeiro centímetro de água.
Dali para a frente e, parecia que para
todo o sempre, iniciava-se um passadiço que, como a estrada no cimo de um muro
de barragem, se estendia até perder de vista. De um lado e outro desse passeio
estreito o mar cintilante erguia-se até às bordas, ronronando, convidativo,
como um gato azul.
“Vamos?”, perguntei. Avançámos os três
por ali fora e logo o mar, de um lado e outro do caminho, avançou alegre sobre
nós, fazendo-me perceber que, se assim o quisesse, podia amplificar-se, erguer-se
e galgar os muretes laterais.
“Pai, sente-se antes aqui...”,
recomendei ao meu pai apontando-lhe a relativa protecção de uma coluna que se desenhava
no muro do nosso trajecto e onde, pensei, ele estaria mais protegido do bater
das ondas que começavam a levantar-se à nossa esquerda e direita.
A água chegou, morna, amigável, cruzou-se
sobre nós, mergulhando-nos até ao peito, encharcando-nos até à boca, e logo
passou, foi à sua vida de refluxo. Sentados no murete, os dedos das mãos
fincados nas bordas caiadas do tijolo, preparamo-nos para a segunda vaga que já
se formava, amigável, constante e azul como a anterior, mas, na sua inteligência
abstracta, na sua existência bruta, pressentia a possibilidade de – não
talvez na próxima onda, mas numa das seguintes – sermos arrastados dali para
fora e para um destino em que deixaríamos, de repente, de saber uns dos outros.
Depois acordei cheio de sede.
© Fotografia de Pedro Serrano, Goa 2011.
Classificação:
SONHO
24 março 2012
VOU-TE CONTAR: 48. TELLING TELES
![]() |
Marco Aurélio (121-180 D.C.) |
Repara
agora no que tens debaixo dos olhos
Marco Aurélio,
Pensamentos
Passou já demasiada água sob a ponte e
nada, para além do tédio, se passava nessas visitas que me prendesse a atenção
e, então, as minhas memórias do assunto são perecíveis como os fragmentos de
tecido com que Fifi presenteava os filhos do velho amigo.
Nos longas semanas do mês de Setembro
que sempre passávamos na terra do meu pai, nos arredores de Viseu, havia um
ritual que era preciso cumprir em cada ano: ir visitar os Correia Teles a
Fornos de Algodres, uma terra na ponta de uma estrada cheia de curvas. A mulher,
relembrou-mo a minha irmã Clara, chamava-se Alzira e o marido Alfredo, nome que
assentava bem melhor à sua compleição e temperamento do que o Fifi pelo qual era tratado. Moravam numa
casa à beira da estrada e o que melhor recordo do lugar é a sensação de atravessar
uma tarde onde imperava um marasmo só interrompido pelo zunido sonolento de
moscas barradas por vidraças de janelas.
Fifi era um tipo esgalgado, aparecia-nos
enfiado em fatos demasiado largos e com cortes que já não se usavam, o cabelo,
a ficar ralo, esticado sobre a cabeça à custa de brilhantina, uns olhos,
esverdeados como águas paradas, afundados na cara chupada de ulcerado gástrico.
A mulher não destoava...
Ao fim do dia, desfolhando no banco de
trás do carro catálogos de amostras de tecido (Fifi era dono de uma fábrica),
regressávamos aliviados a Queirã. Acho que até o meu pai, que era quem nos
arrastava para aquilo, se sentia aliviado, tornando-se mais loquaz à medida que
o nosso boca-de-sapo serpenteava em direcção a Viseu e Fornos de Algodres se
esfumava na poeira.
Mas, enfim, o que a minha mãe nos
explicava como justificação daquele massacre era que Fifi era amigo do nosso
pai desde a sua juventude, desde os tempos em que ele andava no liceu. E eu e a
Clarinha silenciávamos nesse espanto do nosso pai – de Fifi Teles! – ter alguma
vez andado no liceu....
Graças aos sete anos que penou no
seminário, o meu pai só ingressou no último ciclo do liceu já tarde, numa idade
em que os alunos já se estão a passar para a universidade. A sensação de
libertação que acompanha essa mudança para a vida civil é notória nas
descrições que o meu pai regista no diário dos seus vinte anos, agenda que
encontrei, depois da sua morte, camuflada no meio de todas as outras agendas
que conservou, numa das gavetas da sua secretária.
Nessa agenda há algo que chama de
imediato a atenção: muitas das entradas são redigidas em inglês, um inglês de
neófito, algumas delas são até mistas: o texto mistura inglês e português numa
mesma entrada! À medida que a percorremos a gente descobre o motivo: o meu pai
usava o inglês como código, para proteger de olhos alheios (que de línguas
estranhas só conheciam as mortas) aspectos mais íntimos da sua existência:
“I spoke three times to Amilosi.”
“I wrote to Amilosi.”
“I saw Amilosi today.”
E, precipitava-se o mês de Fevereiro
para a primavera, de repente esse misterioso nome brota da agenda como
trepadeira, sem percebermos de onde vem mas descobrindo muito rapidamente tratar-se
de uma personagem feminina, e também que aquele “spoke” talvez refira
telefonemas, pois quando estava ao vivo com ela o meu pai preferia o “saw” ou o
mais específico e satisfatório “went to the cinema with Amilosi and sat down
near her”.
![]() |
1937. |
“Fomos, eu o Teles e o Rogério Teles
para lá da estação beber uma célebre garrafa de champanhe acompanhada de
pastéis de Vouzela...”
Só em 6 de Maio o mistério nos é desvendado:
“Fui à festa da Senhora da Saúde onde
prendi uma Mademoiselle, Maria da Luz Teles I love you.”
e ficámos a perceber que a misteriosa
Amilosi é, para além de irmã do companheiro e amigo Alfredo Teles, uma rapariga
solidária e generosa:
“ I spoke to Amilosi who was no
cravanço para os tuberculosos.”
A 12 de Maio, uma quarta-feira, o meu
pai “asked her a photograph”, mas dessa fotografia, ou da simples informação sobre
se o pedido foi correspondido, perdeu-se o rasto, assim como de Amilosi, uma vez que as raras entradas da agenda de 1937 após o Verão deixam de a referir de todo,
como se com a chegada do Outono o vento tivesse começado a soprar noutra direcção.
© Fotografia: Fotógrafo desconhecido, 1937.
Classificação:
VOU-TE CONTAR
17 março 2012
VOU-TE CONTAR: 47. TROCADO EM MIÚDOS
De todos os miúdos que, sentados ao
redor do bispo, pasmam para a objectiva da máquina fotográfica com uma
expressão entre o bovino ou o alucinado há um, único, que parece olhar para
fora da fotografia como se afirmasse pela pose e pela expressão: o meu enquadramento
não é este!
Reparem nele, no extremo esquerdo da
fotografia, de pé, quando era de idade para estar no grupo dos sentados,
encostado aos grandes e cabendo à justa na imagem como se chegara atrasado para
a foto com a sua nova família. Aposto que a chapa foi tirada num Domingo, após
a missa, e que o senhor bispo honrou muito os presentes ao posar com eles sob
as esquálidas janelas do Seminário de Viseu.
Ninguém sonhava que o meu pai tinha
esta foto nem compreendia qual a razão por ser guardada longe dos olhares. Nunca
vira uma imagem sua do tempo do seminário, o pouco que sabia da sua estadia de
seis ou sete anos por lá contara-mo ele sem grande detalhe, de modo que foi um baque
passar uns olhos surpresos por aquele rebanho sombrio e reconhecer de imediato
a jovem ovelha tresmalhada em cuja face parecem dançar traços do meu sobrinho
Gil, do meu filho.
Mais ou menos no Verão em que
encontrei a fotografia descobri duas
agendas de que já por aqui falei (O mistério das agendas pretas) e cuja leitura
me ajudou a compreender a direcção em que olharia o meu pai nesse Domingo a
preto e branco de 1929 ou 1930 (teria ele os seus treze anos?), e em que só o olhar parece conseguir escapar ao que era o seu presente nessa manhã submersa.
O meu pai ficou sem mãe ainda criança
e o meu avô viu-se a braços com dez filhos pequenos, dos quais sete inúteis seres
do sexo feminino, não despacháveis de imediato. Nesses dias,
as opções de futuro de uma mulher passavam sempre, se não fosse um coiro
intransponível ou tivesse dote, pelo casamento e as de um macho por escolher
entre cara ou coroa, que é como quem dizia escolher a cara de um militar ou a
tonsura de um padre.
Encurralado, o meu avô paterno tratou
logo de semear as raparigas mais novas pela casa das tias mais próximas e dois
dos três rapazes foram endereçados ao seminário, um deles o meu pai. Cama,
mesa, roupa lavada; educação garantida e futuro razoável; quanto à infância
ainda por cumprir, o miúdo que a dobrasse e a metesse no saco...
“Dia radioso! Aniversário natalício do
Sr. Eduardo Serrano. Quantas belas recordações já não nos traz um relancear de
olhos através destes 18 anos passados sobre a terra”, escrevia ele, na agenda
de 1935, no dia dos seus 19 anos. Aniversário passado no seminário, sozinho,
festejando-se a si próprio e desejando que o Verão chegasse depressa para se desforrar na caça, numa pescaria.
É, aliás, o mais vincado sentimento
que deixa a leitura das páginas desse diário sucinto, registado em agenda
comercial: a solidão de um rapaz que se foi fazendo sempre sozinho, pois o pai,
nas visitas que faz a Viseu e aos seminário, é sobretudo para “encomendar 25
missas pela almas do Purgatório”. Com alegria, o meu pai regista as ocasiões em
que passou por lá uma das irmãs mais velhas e lhe deixou um açafate de cerejas
ou pêssegos e nunca, ao longo desse ano, uma única queixa ou sinal de desalento
é passado a tinta.
Seriam características que manteria ao
longo da vida, as de não se queixar dela; as de observar e celebrar com
deslumbramento a natureza lá fora:
“7 de Março – O sol macio! O céu
acrisolado como ainda não vi este ano. Houve missa cantada.”
Mas, nas entrelinhas dos registos, aos
olhos de quem teve uma infância e juventude menos agreste, impressiona a
solidão gelada dos dias daquela agenda, de quem só percebi o motivo para ter
sido conservada quase no final da leitura: foi nesse ano de 1935 que o meu pai ganhou
coragem e, sem uma mãe que amaciasse o terreno do embate, comunicou ao meu avô
que não queria seguir o destino que este lhe tinha traçado, que não queria ser
padre e que eram suas intenções completar o ensino liceal cá fora e aprender
inglês!
Por quem? Ora, por quem! Leiam, Marco
Aurélio, porra, está tudo nos clássicos!
© Fotografias: (1) Foto Beleza, Viseu/Porto, 1929/1930[?]; (2) Pedro Serrano, Porto, 2010.
Classificação:
VOU-TE CONTAR
15 março 2012
FRANGO À PASSARINHO
Hoje, ao cair da tarde, estava eu
tranquilamente a responder aos mails encalhados no computador, quando ouvi um
restolho seguido de um grito, único e que me pareceu proveniente do aparelho
sonoro de uma ave; não um pio, como seria de esperar em condições normais, mas
um grito de uma aflição raiando o estertor.
Como
sei o que a casa gasta olhei automaticamente para a janela em frente à mesa em
que trabalho e onde, por trás de uma vidraça virada a sul, a Mia costuma
estirar-se a gozar o calor da tarde e o morno remanescente do poente. O parapeito
da janela quedava-se vazio.
Levantei-me
de um pulo, abri a porta da rua e, por entre as minhas pernas, correu a Mia com
uma pincelada amarela de penugem entre os dentes, na qual consegui reconhecer, de raspão, o nariz breve e ridiculamente aquilino de um periquito.
Como a
situação era de aguda urgência, pensei rápido e num comportamento contrário ao
que advogam as reportagens sobre o mundo animal do National Geographic Magazine,
violando a regra do observador não dever interferir nas vicissitudes da
selecção natural e da cadeia alimentar, fui buscar uma vassoura atrás da porta.
Entretanto,
a Mia escondera-se debaixo da mesa da sala de jantar, pois a minha agitação deve ter-lhe cheirado mal. De vassoura em riste comecei de a tentar
enxotar dali para fora, sendo o meu fito perturbá-la de modo a que abrisse os
maxilares e o encalhado periquito pudesse levantar voo ou, pelo menos, se
arrastasse para longe dos caninos da gata.
Sob a
mesa, numa pose muito profissional, a Mia fazia slalom entre as pernas da mesa
e das cadeiras, tentando evitar que o pau da vassoura lhe fosse assestado no
lombo, desiderato que só atingi quando ela, disparada como uma seta, deixou o
abrigo e fugiu em direcção à porta aberta. Mas, apesar das pauladas que lhe
consegui acertar até à liberdade, ela manteve a boca bem cerrada e na qual o
periquito se assemelhava cada vez mais a uma ave empalhada!
No
quintal, por entre os laivos amortalhados e sanguinolentos do poente, ainda
consegui amortizar-lhe uma derradeira batucada no lombo antes que saltasse por
sobre o muro para casa da minha vizinha D. Luísa, com grande probabilidade a
dona da defunta ave. Vencido, regressei a casa, arrumei a vassoura atrás
da porta, pensei em ir tratar do jantar.
Como não
come o que esventra e decapita, caçando apenas para me demonstrar que está em
forma, suponho que o que resta do periquito deve estar a arrefecer nalgum canto
sombrio do jardim, servindo de ceia a qualquer outro subnível da cadeia
alimentar.
© Fotografias de Pedro Serrano, (1) 2010; (2) 2011.
Classificação:
ANIMAIS,
RECEITAS COZINHA
13 março 2012
MIRA, QUE PRECIOSO!
Gosto imenso desta foto, não sei é bem
explicar as razões. Foi tirada na igreja de S. Francisco Xavier, em Goa, e tive
a sorte de, estando sentado num banco do lado oposto, estar a focar alguma
coisa que se encontrava por cima da moça. Quando a máquina deslizou para baixo,
apanhei-a a virar a cabeça e aquele olhar valia ouro....
Na igreja de que falo, edifício com a
imponência de uma catedral, está sepultado o próprio santo. Sepultado não é
termo preciso, pois o que resta do homem não está sob nenhuma laje tumular, o
corpo jaz envidraçado ao nível dos nossos olhos como uma bandeja de tíbias na
montra de uma pastelaria.
Em 2003, quando estive na Índia com o
Zé João, andámos a espreitar a relíqua, até comprámos uns postais alusivos. Mas
este ano não me apeteceu ir rever o santo, pois, aos meus olhos a que falta
transcendência mística, a imagem é um tanto sinistra. É que o homem deu o berro
em 1552 e, apesar de bafejado pela santidade, podia bem estar na secção Antigo
Egipto do Museu Britânico de tal modo se encontra carcomidinho.
Mas isto sou eu, que a fila para o
ver, para tocar no caixilho (na Índia as pessoas passam a mão pelos ícones
sagrados, gostam de um contacto físico com as imagens, de deixar deslizar uma
mão carinhosa ao longo da figura – é bonito ver isso), a fila, dizia, é sempre imensa;
começava nesse dia fora de portas e atravessava toda a imensa nave da igreja...
E a parte central desse cordão humano
agitava-se um pouco mais do que as extremidades, dado ser constituída pela
revoada de alunos de um qualquer liceu, trajados a preceito como em todas as
escolas orientais; as raparigas de camisa branca engomada e saia azul-escuro
com peitilho.
Em pleno exercício do dever escolar de
visitar o santo, de ir tocar o vidro do sarcófago, a rapariga da foto olhou de
repente para trás, em direcção à porta da igreja, com um olhar em que luzia
vida e juventude, curiosidade pelo ruído forte que se coava do mundo material.
Dali a uns minutos, supus, iria ser
prendada com uma emoção forte quando a sua expectativa de santidade se
confrontasse com a realidade da marca que o tempo deixa em qualquer um de nós.
Bem, qualquer um de nós é como quem diz: olhem que para 460 anos o homem até
está muito bem conservado! Não tenho dúvida, aliás, de que a Duquesa de Alba
corroboraria a minha opinião.
© Fotografias de: (1) Pedro Serrano, Goa, 2012; (2) Ana Rodrigues, Fort Cochin, 2012.
10 março 2012
OS ANEIS DE SATURNO
Algures
durante a próxima semana, não estou seguro quanto ao dia, este
blog atingirá os dois anos de existência. Compete-me agora suspirar, revirar os
olhos, dizer:
“Meus
Deus, como o tempo voa...”
Durante
este dois anos, SEM COMPROMISSO.com teve cerca de 36.000 visitas e pôs no éter crónicas curtas, contos, poemas,
fotografias, músicas, pequenos filmes e outros textos avulso. Para os ouvintes
potencialmente interessados aqui fica um resumo comentado dos textos que
obtiveram mais sucesso, medido por um número de visitas superior a 170. Eis o top ( pode ler ou reler os textos clicando com o rato sobre o título):
1. Once
Upon a Time: Na cozinha da tradução dos Lyrics 1962-2001 –
608 visitas. Texto que é uma espécie de visita aos bastidores da tradução para
português da obra lírica de Bob Dylan, feita pela minha amiga Angelina Barbosa
e por mim entre 2005 e 2008.
2. Hipótese Nula, 350 visitas. Este segundo lugar no top dá-me grande
satisfação, pois trata-se de um poema, género habitualmente não muito querido dos
leitores. Ainda por cima, este poema é um exercício que mistura linguagem
científica e linguagem poética!
3. Mão Morta– 275 visitas. Conto médico baseado numa história real passada numa
Angola em guerra civil.
4. Vou-te Contar: 22. Flagrantes da vida real– 267 visitas. Vou-te Contar é um folhetim em episódios em torno das casas onde
morei e das pessoas que lá viveram, uma saga familiar. Este folhetim revelou-se
um grande sucesso e vários episódios atingiram o rol dos textos mais lidos
do blog. O episódio n.º 15 (Não há duas sem três),por exemplo, somou, até
hoje (11 de março de 2012), 208 visitas.
5. Remédio Santo– 262 visitas. Conto passado num agreste inverno trás-montano e cuja
trama gira em torno da verificação de um óbito feita numa manhã gelada e com lobos na paisagem.
6. E Esse Sono Que Não Desce– 246 visitas. Relato de um telefonema tardio sobre
uma criança que não adormece e a ansiedade da sua estremosa mamã.
7. Calaram-se as Musas– 185 visitas. Obituário dedicado a Suze Rotolo, aquela que
foi uma das namoradas mais queridas e a musa mais influentes na obra de Bob
Dylan.
8.
Finalmente, A Sua Coisa é Toda Tão Certa(com 172 visitas), uma aventura passada
num cabeleireiro em Cabo Verde e contendo pormenores escabrosos sobre depilação
íntima.
Para
além dos textos citados, que podem ser lidos percorrendo a página principal de Sem Compromisso de cima para baixo, o
blog contém ainda algumas páginas individualizadas, sobre assuntos específicos. Uma
delas permite o acesso à versão integral do livro Coração Independente, livro
editado em papel, mas que na sua versão electrónica foi acedido durante estes dois
anos mais de 2.600 vezes. No
Verão Fico Sempre Mais Nova, romance que publiquei na Amazon em
Agosto de 2010 tem o seu primeiro capítulo divulgado na íntegra no blog e esse
pedacinho foi visitado 655 vezes.
Antes
de terminar, umas palavras rápidas sobre o perfil geográfico dos meus ouvintes.
Quem são essas pessoas que vêm aqui espreitar? A sua grande maioria está em
Portugal, em segundo lugar no Brasil e em terceiro lugar surgem leitores que residem nos Estados Unidos da América. Depois tenho leitores em vários países de África
e da Europa e verificar que tenho gente que me visita da Polónia e da Indonésia deixa-me
tão boquiaberto como se vislumbrasse um ouvinte girando nos anéis de Saturno,
sintonizado no meu blog com o seu portátil nos joelhos.
Nota: Um agradecimento ao Ricardo Bonfocchi que foi quem me empurrou para esta aventura de criar um blog e, não contente com isso, me tem ajudado nos aspectos técnicos mais complexos que sustentam um empreendimento desta natureza.
Imagens, de cima para baixo: (1) e (3) Fotografias de Pedro Serrano, Lisboa 2009; (2) L. Testut, livro de Anatomia Descritiva.
Classificação:
SOCIEDADE
06 março 2012
UM MONÓLOGO DO CARALHO
![]() |
Martin Schulz (presidente). |
Com aquela quedazinha que os alemães
têm para dizer aos outros como proceder, um senhor chamado Martin Schulz, um
tipo que se entretém a fazer recortes de imprensa, passatempo que acumula com o
de presidente do Parlamento Europeu, acusou recentemente Portugal de estar
condenado ao “declínio”.
Segundo Schulz, esse declínio
derivaria em grande medida da nossa atração por Angola e com o facto de o
primeiro-ministro português ter visitado aquele país em busca de investidores
para negócios luso-angolanos. Ora para Schulz isto é um crime de lesa-Continente,
pois, para ele, não existe solução para Portugal fora do contexto europeu.
Penso que é fácil para todos nós
perceber que o homem, para além de se estar a meter onde não foi chamado, nada
percebe de Portugal e das suas muito velhas relações com África e, pior ainda, não
sonha que a Europa está estafada e que Portugal faz muito bem em olhar para
outros pontos do globo, particularmente para aqueles com quem convive há vários
séculos como a África e a Ásia.
Quando este senhor alemão regurgitou
estas pérolas de aconselhamento estratégico todo o Portugal lhe caiu em cima e
quem não o fez explicitamente ficou, pelo menos, com vontade de lhe assentar
umas boas laponas, especialmente os 150.000 portugueses que trabalham
actualmente em Angola.
Houve, no entanto, uma excepção,
alguém que bateu palmas ao que o homem disse, que saiu a terreiro para o defender
e voltar a enfiar no micro-ondas da indignação o requentado prato do parecer
impossível estarmos a manter relações com um regime tão corrupto e
anti-liberdades-e-garantias como o é o do senhor José Eduardo dos Santos. A
senhora que se pôs em bicos de pés para gritar ao mundo tudo isto é uma
portuguesa e, em última análise, empregada do senhor Martin Schulz, pois é
deputada no Parlamento Europeu onde, entre outras funções de destaque,
desempenha as de “Membro da Delegação para as Relações com o Iraque”.
Uma nuance que quer o democrático
presidente do Parlamento Europeu quer a exaltada dama (que recorda um pouco uma
caricatura do Herman José) não parecem ter compreendido é a seguinte: Angola e
o povo de Angola estão, na generalidade, gratos ao seu presidente José Eduardo
dos Santos. Que chatice! Por muito imperfeito, por muito atrasado que esteja o
país e que a corrupção seja um sério problema é sempre sensato comparar o que
os angolanos têm hoje com o que tinham há apenas dez anos atrás. E o seu maior
bem durante 30 anos foi uma guerra civil, com tudo o que isso acarreta: isolamento,
morte, instabilidade permanente, destruição de cerca de 70 % das estruturas de
saúde e de educação, fome, doença... Resumindo: a incerteza se no dia seguinte
iam acordar vivos ou, quando muito, a solitária perspectiva de ignorar que nova
desgraça se ia juntar às anteriores! Alguém imagina o que isto é?
“Eu agora só quero é tentar viver os
anos que ainda tenho pela frente ...”, disse-me um dia uma angolana, num
desabafo que traduz bastante fielmente o que se sente naquele país. Hoje o país
está em paz, pode voltar-se a dar conta que o sol nasce, despedir-se com uma boa
certeza de um “até amanhã”.
![]() |
Ana Gomes (deputada parlamento europeu). |
Por todos este bens, os angolanos
estão gratos ao seu Zédu, uma vez que acabou com a guerra, pôs o país no mapa de
África e até do mundo, pois, como se surpreende quem lida com eles, os
angolanos são hábeis e duros negociadores quando se trata de negócios
estrangeiros. Se tiver sorte, se lhe derem em paz os 30 anos que perdeu em
guerra, talvez Angola venha a ser o país que sonha ser aquele povo orgulhoso. Daqui
a três décadas José Eduardo dos Santos provavelmente já não será vivo, mas terá
garantido um rodapé na História de África e não pelos piores motivos.
Entretanto, li-o hoje no jornal, a
nossa efervescente deputada tem em mãos insignes desafios que, inequivocamente,
marcarão o futuro da Europa: vai ser actriz e exibir para todo o parlamento
europeu o seu papel na peça Monólogos da
Vagina. Que não se engasgue em palco são os nossos votos sinceros.
Classificação:
SOCIEDADE
05 março 2012
Subscrever:
Mensagens (Atom)