Tornam-se sinistros os personagens
ridículos a quem foi conferido (nem que seja pelos próprios) demasiado poder.
1. É o caso de Nicolás Maduro, o homem
que se entretém a dar cabo do que ainda resta da Venezuela, e que, após a campanha para promover a criação
massiva de coelhos como forma de resolver a fome que provocou no país, resolveu
– agora que foi Natal e a lágrima é mais fácil – enfiar um pernil de porco na meia
de cada família venezuelana.
Para isso contava, ao que parece, com
a famigerada generosidade do povo português, povo que – derivado do seu muito à
vontade com a suinicultura – forneceria os tais pernis, uma tradição de
partilha iniciada nos dourados anos em que José Sócrates resolveu estreitar
relações com alguns paladinos das democracias sul-americanas que, como ele,
adoravam ideias luminosas e negócios-relâmpago. Assina o meu protocolo que eu
logo assinarei o teu.
Mas acontece que os pernis não chegaram a tempo à consoada
venezuelana e o povo – farto de feijões e de rapar enlatados – deu-se conta e
terá gemido... E lá vem Maduro à TV informar os aguados compatriotas de que
teria havido uma cabala e que o culpado tinha nome: “Portugal”, afirmou
sonoramente. Inclusive, Nicolás teria já dois imensos navios prontos para
transportar o pernil de Lisboa, mas até isso fora boicotado, mais um daqueles
golpes contra a soberania venezuelana que o PCP, partido irmão, tanto tem denunciado.
Nos ecrãs portugueses, o Ministro dos Negócios
Estrangeiros apressou-se a garantir que o Governo
nada tinha a ver com o boicote dos suínos. O suspense, aliás, só seria aliviado
no dia seguinte quando o povo luso ficou finalmente a saber que o pernil não
seguira uma vez que a Venezuela não paga, desde
2016, as facturas a quem o fornece.
2. Por cá, quem esteve quase quase a
ter um sapatinho especialmente recheado foram os partidos políticos, pois, num
alinhamento milagroso que só mesmo na quadra natalícia, resolveram cumular-se das
bênçãos contidas naquilo a que se tem chamado a “lei do financiamento dos
partidos”. Basicamente, segundo o sonho colectivo dos deputados, os partidos
deixariam de ter limite na massa que podem açambarcar para se financiar (até
agora com um tecto), e deixariam de pagar IVA pelas transacções relacionadas com
a sua actividade. Esta maravilha legal, a que todos – com excepção do CDS –
deram aval imediato, foi negociada às escondidas por todos eles no período muito
conveniente das Festas, quando toda a gente andava entretida com as compras, o
Natal dos queimados e o pernil do Maduro. A porra toda foi que o Presidente da
República, mau-grado a hérnia entalada e a consoada em Pedrogão, se deu conta
da marosca e toca de chamar a atenção dos meninos, do povo... Na consequência, veio
a chefe de turma Ana Catarina garantir, na sua infabilidade assertiva, que a
solução encontrada, em alargado fórum, não acarretava encargos para o país e
para os contribuintes. Pois não, sua espertalhona, talvez nenhum dos
dromedários do costume vá ter de pagar mais impostos por causa disso, mas que
tal informar o rebanho de quantos milhões de euros deixam de entrar nos cofres
do Estado tendo em conta essas isenções do IVA?
Mal, muito mal, nada que a gente já
não soubesse que eram capazes, mas desta vez mostrando às claras que são todos
da mesma massa, isto é dos mesmos euros, e que por aí se conseguem entender bem,
apesar de nunca o parecer possível quando o entendimento são matérias que
interessam ao país. Tudo conduzido às escuras, na maior das premeditações e depois,
quando se foi descoberto, metendo os pés pelas mãos, com aqueles que horas antes
votaram a favor do arranjo a acotovelar-se para serem os primeiros a declarar
que, afinal, até eram contra, ou parcialmente contra; ou nunca a favor sem mais
nem menos. Resumindo: mais entalados do que a hérnia do
Presidente.