Dando como adquirida a minha competência em cooperação internacional, ao aproximar-se o primeiro fim de semana que passámos em Santiago, a Ana C. perguntou-me se conhecia algum cabeleireiro na cidade.
Que
não, respondi, que até já tinha cortado o cabelo em La Habana e em Tóquio, mas
nunca em Cabo Verde. Sugeri-lhe que se aconselhasse com as doutoras que trabalhavam
na Cooperação portuguesa, sempre tão incansáveis a dar resposta às nossas mais
diminutas necessidades logísticas. Ela assim fez e na sexta, à hora de jantar,
apareceu com um look todo envernizado, encheu-me de novidades e aproveitando,
cheia de malícia, a brecha que eu lhe proporcionara ao dizer que se o
cabeleireiro fosse bom talvez recorresse aos seus serviços, pois precisava de
cortar o meu remanescente cabelo:
“O
senhor tem de lá ir... O salão chama-se Beleza
Pura e o cabeleireiro Elvis...”
Previdente,
a Ana C. trouxera um cartão onde, para além de se esclarecer que o tal Elvis
tinha salões em Santiago e em S. Paulo, constavam os telefones. Marquei
apontamento para Sábado às três da tarde e, máquina fotográfica a tiracolo para
o que desse e viesse, parti à aventura, ciente de que um salão que escolhera
para nome uma canção do Caetano Veloso só podia ser recompensador.
Consegui
cortar o cabelo, mas nunca disparar a máquina fotográfica, pois, pelo menos, seis
pares de olhos femininos nunca mais me largaram desde que a minha silhueta se
recortou na porta de entrada, um deles propriedade de Nancy, a recepcionista
brasileira. Quanto a Elvis, também ele brasileiro, esse tratou-me invariavelmente
por “querido” sempre que me interpelou, fosse para indagar se a água estava suficientemente
morna ou para saber se desejava que me aparasse as sobrancelhas.
À
saída, enquanto pagava e por continuar sem abertura para poder usar a máquina
fotográfica, fui circunvagueando o olhar pelas paredes, tomando conhecimento do
catálogo de serviços do Beleza Pura,
que incluía fortalecimentos capilares e extensões, mas também préstimos de
qualquer tipo de depilação íntima, desde aquela que tem por única finalidade ajudar
a respeitar as fronteiras da parte inferior de um bikini, à poda mais radical.

E,
no meio dessa tarde azul, dei comigo a trautear o “Você É Linda”, outra canção
do Caetano Veloso em que, louvando a beleza das diversas partes da sua
musa, ele se refere a isto mesmo cantando, em voz melosa e sonhadora: “a sua coisa
é toda tão certa...”
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