De ti
De quem presenças várias poderia recordar
Ficou-me deveras e sem que se explique
A travessia de uma rua...
Éramos três os que caminhavam,
Alinhados nos passos e na oportunidade
E terias chegado há pouco à cidade
Era sempre então essa
A sensação de estar ao teu lado
A de que acabaras de chegar e contigo novidades
Embora as novidades pudessem ser somente tu
Apenas isso, mas que só por si nos animava
Animava a própria cidade e os olhos
De a vermos, vestirmos, desbravarmos
Como se de igual modo acabássemos de desembarcar
Nas suas ruas, avenidas, vielas e janelas.
No atravessar que os três aguardava
Tu, eu e mais alguém que não descortino,
Excepto por nenhum de nós ter ainda vinte anos,
Nessa travessia nos vamos agora
Como se uma maré concedesse trégua vasa
E o tráfico se empatasse num espanto raso
Eu, tu e não sei quem outro
Agora já na outra margem, sob a janela larga
Idealizada como um tríptico para que um dia
Pudesse aspirar a tornar-se o par de um trio,
Espreitando a chegada
Como o cais de um porto seguro.
Os três boiando num aproximadamente sorriso
Por ser manhã, por termos chegado ou somente
Porque é diverso o como se vê deste lado da rua
Cabeças atentas, mãos nos bolsos, uma madeixa brilhante
Afastada à testa e logo voltada a tombar
O quase sorriso surripiando-se à nossa gravitas comum
Ascendendo dos trilhos amarelos dos eléctricos até ao
Firmamento, por entre tropeços, telhados e nuvens esfuziadas
Na alegria leve que só em nós não se demorava, pois
A vida é breve, grave, assim achamos e nada sabemos
Sob todo esse peso do mundo
No chilreio citadino do findar dessa manhã
Onde um dos três não quer ser o primeiro a dizer:
E agora...?
Agora,
Deixam cair na caixa de esmolas da minha ignorância,
Garantem-me que foste de viagem pelas repetentes
Quelhas, ruas e avenidas do esquecimento
Lugar cendrado e triste onde chove sempre um pouco,
Aí andarias, sem dares notícia ou alguém que as recolha.
Talvez então, pela noitinha ou num final de manhã
Nos encontremos por aí numa rua ou numa ombreira
(plof do guarda-chuva que enrolado me acompanha,
bicando o chão como se picasse folhas-mortas)
E te ofereça resguardo
Sob a repentina copa da cor madura do melão
Visto que ambos seguimos na mesma direcção
Avec le temps, va tout s’en va
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