Ainda não são bem seis da manhã e já
há claridade em Luanda, uma luz plúmbea, que foi barrada no seu jorro por um
céu carregado de nuvens sujas que parecem anunciar chuva. É uma ilusão
tropical: estará assim até ao fim da manhã e depois o céu vai-se abrir, como uma
flor exótica, numa revelação de azul e sol crocante.
Aqui em frente à minha janela do nono
andar há um musseque, um bairro de lata, portanto, que o Jorge S., noutra
janela do hotel, julgava, a uma distância de olhos mal habituados,
desabitado, tal é o seu ar desolado e caótico de vazadouro de chapas e lixo.
Mas uma teleobjectiva faz milagres de
subjectividade. Fazendo-a passear-se sobre os detalhes, irrompem no meio da
massa confusa as antenas parabólicas, um aparelho de ar condicionado espreita
aqui e acolá, há roupa a secar numa corda, uma luz ficou acesa toda a noite,
como quem anuncia a porta de um lar para alguém que pode chegar
tresmalhadamente fora de horas.
© Fotografia de Pedro Serrano, Luanda, Setembro 2014.
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