12 julho 2015

ENTRETANTO EM ATENAS... ENTRE O CÉU E A TERRA


É bom ter alguém à nossa espera na porta de saída de um aeroporto e Marilyn Marlene estava lá com o seu táxi amarelo. Coitada, chegou religiosamente a horas mas teve de esperar um bom bocado, pois a Iberia perdeu-me a mala em Madrid, talvez ma entreguem amanhã ou depois de amanhã em Hydra. Sábado à tarde as lojas estão fechadas em Atenas, tive sorte e topei com uma farmácia de serviço onde pude comprar pasta dos dentes e a respectiva escova. Como se estivesse à minha espera, o tubo de pasta tinha instruções em duas línguas: grego e português. Oh, quanto à lâmina de barbear foi só fazer o gesto de passar uma vassoura pela face num quiosque perto do To Theatron.
No To Theatron a salada de abacate, tomate e pistáquios está no seu esplendor: os tomates doces e sumarentos, o abacate macio e no ponto – desfaz-se na boca e não sob o garfo –, a cebola crocante, o mozzarella acabado de parir. É impossível tentar fazer algo igual em Portugal, por muito que se tenha coscuvilhado os ingredientes: falta o solo, o sol e o azul locais. O Theatron tem uma esplanada do outro lado do passeio, um espaço apenas coberto por um breve telhado, as paredes abertas dos dois lados para deixar deslizar o fresco. As potentes ventoinhas rodam sem parar e tem acoplado um sistema que sopra vapor de água gelado sobre os clientes, um melhoramento em busca do bem-estar absoluto; sento-me por perto.
Na mesa ao lado, um casal de alemães que passaram o jantar sem trocar uma palavra entre si, confere minuciosamente a conta, um total que (tendo em conta o que comeram e os preços praticados) não deve ultrapassar os 22 euros para os dois. Depois, com modos severos, chamam a empregada – uma morena despistada, gentil e com um ar de quem pede colo ao mundo – e exigem factura com NIF, que eles, apesar de em férias, não vão perder a oportunidade cívica de ensinar aos gregos como se trilha o caminho correcto para a resolução da dívida e o evitar do 4.º resgate. Depois levantam-se e, já no limiar da saída, param e, ocultos um pelo outro, conversam em voz secreta. Foram acometidos por um ataque de má-consciência e agora ele – tapado por ela – vasculha nos bolsos e regressa à mesa que tinham ocupado a deixar uma gorjeta excessiva.
É quase meia-noite e está uma noite maravilhosa, azul-veludo, de tshirt. Regresso ao hotel perdendo-me um pouco pelas ruas silenciosas e sossegadas do Pireu (uma espécie de Leça da Palmeira de Atenas), mas nunca é grave pois mais volta menos volta dou sempre com a porta.
Contou-me a Marilyn que o Varoufakis saiu ontem por aqui – pelo porto do Pireu – para Egina, uma ilha a 27 km de Atenas, para férias. Agora que os gregos correram com o seu ministro das finanças sobre duas rodas, os alemães deviam seguir-lhe o exemplo e replicar a receita: correr com o seu autoritário ministro das finanças sobre duas rodas, o senhor Schaube, que não conseguirá nunca aprender que lá porque o país dele é muito rico isso não lhe dá todo o direito a sentir-se tão cheio entufado de razão. mais coisas entre o céu e a terra Horácio... Se ele tivesse outros pensamentos para além da máquina de calcular deveria ter-se dado conta que, apesar de apenas por um momento, os gregos fizeram-no (a ele e a toda a restante Europa) lamber o pó em que todos um dia havemos de nos transformar.
© Fotografias de Pedro Serrano, Pireus (Grécia).

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