O gerador do hotel é omnipresente na rua, como se
alguém tivesse deixado um camião com o motor ligado e um tijolo esquecido sobre
o acelerador. Não se consegue sequer escapar-se-lhe do lado de lá da rua, no
“Farol do Porto”, um restaurante com esplanada ou, melhor dizendo, uma esplanada que é
restaurante e onde o proprietário, um alentejano que mora por aqui há um quarto
de século, tem mesa reservada. Não admira, passa a vida lá sentado, recebe cada
cliente individualmente abancado como um soba de adopção, inclinado para trás
na cadeira, pois tem um ventre tão abrangente que de outro modo embarraria na
mesa, tombá-la-ia. Enquanto vai apontando um controlo-remoto ao plasma de LCD,
pendurado numa coluna no lado oposto da esplanada, e mudando os canais à medida
que se irrita com o que está a ser emitido, o Sr. Torres ingere enormes
talhadas de melancia, que ele mesmo seccionou com a reverência de quem trincha um peru. O
fruto tinha um ar tão rubro e o apetite prazeroso do homem era tão visível que, à
sobremesa, pedi uma fatia para mim.
“Não há...”, comunicou-me a
sorumbática empregada.
“É do patrão...”, resumiu ela,
propondo-me manga como alternativa. Não fiquei a perder, eu que nem aprecio
grande coisa a fruta exótica. Duas fatias finas e longas, alaranjadas como um
sol nascente, com meia lima a fazer contrastar a cor e sublinhar o sabor. Ainda
hesitei sobre uma segunda dose mas afazeres profissionais esperavam-me às duas da tarde, de modo que
fui despedir-me do Sr. Torres e vazei.
“Boa sesta...”, desejou ele.
“Boa sesta...”, desejou ele.
© Fotografias de Pedro Serrano, Bissau, Setembro 2015.
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